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20.11.12

Hard copy 65


A TDM é uma empresa estatal moçambicana. O que faz disto um anúncio institucional. Provavelmente foi encomendado a uma agência. Embora, institucional ou não, com ou sem "profissionais" contratados, não fizesse qualquer diferença. São tantas e tão boas as camada de mau que até se torna redundante satirizá-las. Mas se pensarmos que esta realidade pode ser a nossa num futuro próximo... 

P.S. Acordo Ortográfico. Pois com certeza.

26.10.12

Há-des ver se o filme é bom


É reconfortante ver o trailer para um filme português no qual o protagonista profere algo como: "Ela sabia que iam haver consequências para as suas acções...". O cosmos parece dar-me razão. Até argumentistas pensam que o verbo haver sofreu uma mutação bizarra. Boas novas, amigos, este verbo escapou aos inúmeros estragos e continua a ser impessoal nas acepções de "existir" e "acontecer" ("Ela sabia que ia haver consequências por ter faltado às aulas"; "Ele não sabia que havia inúmeras gramáticas") e a concordar com o sujeito nas restantes (surgindo sempre como auxiliar - "Eles haveriam de, eventualmente, aprender a conjugar verbos"; "Elas hão-de conseguir escrever como se tivessem completado a 4ª classe"). Não creio que seja uma boa entrada em cena para um instrumento "de cultura". Ou de lazer. Ou lá do que for. Chiça, já me viram aquele cartaz?!

25.10.12

Não há coincidências

   
Lido recentemente no iOnline. É "oitro" acordo, só da Lusa. Vou designar o meu por "cornográfico", "horto gráfico" ou ainda "tripa à portuguesa". Vai haver um para todos.

24.10.12

Acordo, o escambal!


Por força das circunstâncias tenho vindo estudar, de forma lenta e dolorosa, o velho novo acordo ortográfico. E quanto mais me adentro na coisa, mais se adensa, não já o cepticismo, mas a pura aversão. Macacos me mordam se vou adoptar a bem este monstro criado pela burocracia travestida de pedagoga. Ora vejamos alguns exemplos, retirados de um blog brasileiro apropriadamente intitulado Português na Veia (à força).

No que diz respeito à acentuação gráfica:

1) Some o acento dos ditongos “éi” e “ói” de palavras paroxítonas.

Antes: jibóia, assembléia, idéia, heróico.
Depois: jiboia, assembleia, ideia, heroico.

ATENÇÃO! Só desaparece o acento das palavras paroxítonas. As oxítonas continuam acentuadas.

Ex: papéis, herói, dói.


Tendo em conta que o principal fundamento das alterações é de ordem fonética (a actualização que a oralidade imprime na escrita e consequente necessidade de normalização - regras que, lembre-se, não são meramente gramaticais, mas também morfológicas e sintácticas, com as decorrentes implicações semânticas. Um processo lógico e normativo que, naturalmente, se esvaíu na diarreia mental que é o A.O. de 1990), faz todo o sentido que, no português de Portugal, desapareça o acento (diferenciador fonético), por exemplo, em "heroico", que, como se sabe, é maioritariamente pronunciado com o [o] fechado, como se estivéssemos acomeditos de uma constrição faríngea ou com um grave problema no maxilar. Por outro lado, "papéis", claro, a grande maioria dos portugueses articula com o [e] aberto, escancarado a bocarra para produzir um som vocálico capaz de puxar o vómito.

(...)

4) Some o acento diferencial das formas pára/para, péla/pela, pêlo/pelo, pólo/polo e pêra/pera.

Antes: pára, péla, pêlo, pólo e pêra.
Depois: para, pela, pelo, polo e pera.

ATENÇÃO! O acento circunflexo para diferenciar as palavras forma/fôrma pode ser usado opcionalmente. Indica-se o uso do acento para conferir maior clareza.


Pois então, não sendo difícil qualquer desempate contextual entre "pêlo" e "pelo", ou "pára" e "para" - porque os falantes portugueses estão entre os mais proficientes do cosmos e isto só vem facilitar a comunicação entre a malta - é absolutamente imprescindível que, de acordo com o racionalismo puro que emprenhou estas deduções linguísticas, "forma" e "fôrma" se diferenciem SEMPRE nas formas falada e escrita. Entretanto, caga nisso que o pretérito perfeito e o presente do indicativo ("andamos/ andamos") não comporte qualquer traço distintivo. Genial! Recomenda-se, portanto, ter um caderninho sempre à mão para eventuais esclarecimentos escritos ou desenhados.

5) Desaparece o acento agudo no “u” forte dos grupos que/qui/gue/gui de verbos como apaziguar, averiguar, arguir.

Antes: apazigúe, averigúe, argúi.
Depois: apazigue, averigue, argui.


(Conjugação do verbo "arguir", aqui.)

Quanto a esta pérola, que começa por ignorar a particularidade dos grupos [gu] e [qu], dá origem a tal confusão que prefiro transcrever o texto de um especialista, para eventuais interessados em (tentar) perceber a choldraboldra instalada:

Ora, quanto ao verbo arguir, eu é que faço algumas objecções na nova grafia recomendada pelo novo AO. De facto, argui («ele a.»), arguis («tu a.»), arguem («eles a.») deixam de ter acento. No meu ponto de vista, porém, no grupo gu ou no qu, o u, indissociável da consoante, ou é um símbolo que não se pronuncia ou tem o valor de semivogal quando não é tónico. É esta particularidade que não permite separar o u da vogal seguinte na translineação quando o u se pronuncia.

No novo AO, assemelha-se a grafia de argúi à de intui, quando as características do grupo gu são peculiares, o que justifica a diferença entre, por exemplo, arguimos e intuímos (o novo AO tem delinquimos, logo será na nova regra arguimos, como tem sido sempre, incoerentemente porque se depreende que passa a ser arguís [vós], como delinquís [vós] no texto).
Não creio que esta novidade, ao arrepio das decisões de bons vernaculistas anteriores, seja obra portuguesa.

Conclui-se:

Primeiro, que a inferioridade está agora do lado de Portugal. Se não podemos culpar os brasileiros por terem assim um amor tão grande à nossa língua, a ponto de apresentarem já um trabalho monumental sobre o novo AO, o que devemos é lamentar que não haja da nossa parte amor equivalente. 
Em segundo lugar, lembra-se que aberto um precedente pelo Brasil em não respeitar o texto do acordo de 1990, também eu posso recusar em Portugal as novas formas do verbo arguir recomendadas pelo novo AO; e fica aberta a porta para uma disputa de alterações discricionárias ao texto do acordo, dado que em Portugal estamos sem rei nem roque.

D´Silvas Filho, in Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, 2009

Em diversos suportes "explicativos" do novo A.O., atesta-se, com confiante sapiência, que "(...) as conjugações do [sic] verbos 'arguir' e 'redarguir' deixam de ter acento" (in Aprende o Acordo Ortográfico com o... Prof. Girassol, Girassol Edições, Lda). E mai'nada. Pobres crianças. Pobres de todos nós.

Poderia ainda referir a acentuação algo discricionária dos verbos terminados em [guar], como "enxaguar", de acordo "com a pronúncia", mas já estou exausto. Onde apelo que se passe a grafar de acordo com as diversíssimas variações regionais da mesma, para tornar esta merda ainda mais divertida e desafiante.

Ilustração: Leslie A. Wood

4.10.12

Nunca foi diferente


"Your letter riled me to such an extent that I’m answering immediately. Who are all these ‘real people’ who ‘create business and politics’? and of whose approval I should be so covetous? Do you mean grafters who keep sugar in their ware houses so that people have to go without or the cheap-jacks who by bribery and high-school sentiment manage to control elections.

(...)

It seems to me I’ve let myself be dominated by ‘authorities’ for too long — the headmaster of Newman, S.P. A, Princeton, my regiment, my business boss — who knew no more than me, in fact I should say these 5 were all distinctly my mental inferiors. And that’s all that counts! The Rosseaus, Marxes, Tolstois — men of thought, mind you, ‘impractical’ men, ‘idealist’ have done more to decide the food you eat and the things you think + do than all the millions of Roosevelts and Rockerfellars that strut for 20 yrs. or so mouthing such phrases as 100% American (which means 99% village idiot), and die with a little pleasing flattery to the silly and cruel old God they’ve set up in their hearts."

"F. Scott Fitzgerald Responds to Hate Mail", por Maria Popova, Brain Pickings Weekly, 24/09/2012

13.9.12

Servidão


Este texto foi escrito antes de eu ter lido estoutro, incomparavelmente mais interessante, eloquente e expressivo no emprego das analogias, assinado por Juan José Millás (obrigado, V.). Uma tradução crua e muito clara do sentimento geral, para todos os que enfiam a cabeça na areia e para todos a quem serve a carapuça de cabrão filho da puta.

"Para exemplificar, estamos a falar da colheita de um indivíduo, mas o que o porco filho da puta compra geralmente é um país inteiro e ao preço da chuva, um país com todos os cidadãos dentro, digamos que com gente real que se levanta realmente às seis da manhã e se deita à meia-noite. Um país que, da perspetiva do terrorista financeiro, não é mais do que um jogo de tabuleiro no qual um conjunto de bonecos Playmobil andam de um lado para o outro como se movem os peões no Jogo da Glória."

(...)

"Quando o terrorista financeiro compra ou vende, converte em irreal o trabalho genuíno dos milhares ou milhões de pessoas que antes de irem trabalhar deixaram na creche pública - onde estas ainda existem - os filhos, também eles produto de consumo desse exército de cabrões protegidos pelos governos de meio mundo mas sobreprotegidos, desde logo, por essa coisa a que chamamos Europa ou União Europeia ou, mais simplesmente, Alemanha, para cujos cofres estão a ser desviados neste preciso momento, enquanto lê estas linhas, milhares de milhões de euros que estavam nos nossos cofres. E não são desviados num movimento racional, justo ou legítimo, são-no num movimento especulativo promovido por Merkel com a cumplicidade de todos os governos da chamada zona euro." 

Ilustração: Patrícia Póvoa

31.8.12

No tempo dos dadaístas

 



















não havia Transtorno do Déficit de Atenção.

24.7.12

Expliquem-me como se fosse um atrasado mental de esquerda... ou de direita

O Ministro das Finanças, Vítor Gaspar, apresentou publicamente um livro intitulado A Crise Explicada às Crianças. Este tem a particularidade de ter "duas caras": dum lado uma capa de fundo azul com o conteúdo dirigido a - pasmem-se! - miúdos de direita, do outro uma capa vermelha dirigida a miúdos de esquerda. Lá dentro efabula-se com ilustrações dum urso gordo - o défice - e abelhas furiosas - os mercados. Imagina-se a bela moral da história, dirigida aos paizinhos semi-analfabetos e crédulos. Às crianças explicam-se os factos da vida metaforicamente, com recurso a abelhinhas, flores, ursinhos. A crise também se explica assim, pelos vistos. Às crianças do bibe vermelho, que são de esquerda e às do bibe azul, que são de direita. 


Aos adultos já não é bem assim. Estes necessitam de explicações mais adequadas à sua idade, recorrendo a um imaginário mais maduro, explícito mesmo. Por isso sugiro esta publicação, com alegorias igualmente ilustradas, explicando a crise aos crescidos. Para aqueles adultos - de bibe vermelho ou azul – que ainda não perceberam bem como a hegemonia do poder financeiro anda a fecundar a cidadania e tudo o que apanha à frente. Como pronunciaria uma criancinha inocente: "metafodicamente", claro.


Post de Pedro M.

Archivo pittoresco: as piores capas de livros


Difícil eleger entre as categorias: pior capa, pior título, pior tema para escrever um livro...

Para pior título em português recomendo: Trate a vida por tu, de Daniel Sá Nogueira. Dentro do género de livro de conselhos "Faz o que eu digo, não faças o que eu faço".

Já em língua catalã, gosto particularmente do livro para crianças intitulado Collons, posa't a dormir!. O título começa exactamente pelo vocábulo equivalente ao português, seguido de algo como "toca a dormir!". Cada capítulo consta de uma ternurenta rima, à volta de um palavrão diferente.

De resto, livros para crianças sobre cocó, parecem ser um subgénero literário. 
E também é complicado escolher um título.

Post de Pedro M.

2.7.12

Segredos


 "(...) Meu amor por Alana não aceita essa simplicidade de coisa concluída, de casal para sempre, de vida sem segredo. Por trás desses olhos azuis há mais, no fundo das palavras e dos gemidos e dos silêncios alenta outro reino, respira outra Alana. Nunca lhe disse isso, gosto demasiado dela para despedaçar essa superfície de felicidade pela qual hão deslizado já tantos dias, tantos anos."

Julio Cortázar, excerto de "A Orientação dos Gatos" (retirado de Queremos tanto a Glenda), tradução adaptada

Ilustração: Adam Hancher, "Holding Loneliness"

26.6.12

O mundo segundo Julio Cortázar


 "En el restaurante de los cronopios pasan estas cosas, a saber que un fama pide con gran concentración un bife con papas fritas, y se queda de una pieza cuando el cronopio camarero le pregunta cuántas papas fritas quiere.
-¿Cómo cuántas?- vocifera el fama-. ¡Usted me trae papas fritas y se acabó, qué joder!
-Es que aquí las servimos de a siete, treinta y dos, o noventa y ocho- explica el cronopio.
El fama medita un momento, y el resultado de su meditación consiste en decirle al cronopio:
-Vea, mi amigo, váyase al carajo.
Para inmensa sorpresa del fama, el cronopio obedece instantáneamente, es decir que desaparece como si se lo hubiera bebido el viento. Por supuesto el fama no llegará a saber jamás dónde queda el tal carajo, y el cronopio probablemente tampoco, pero en todo caso el almuerzo dista de ser un éxito."

Excerto do livro Papeles Inesperados, Editorial Alfaguara, com textos inéditos até Abril de 2009.

25.6.12

Os ovos do Chagas

 

 Banner do Chagas na mais apropriada das páginas web




Por falar em charlatães, megalómanos e ególatras, "o Mourinho da escrita", a criatura que revolucionou a técnica redactorial no seu galinheiro e está convencido de que pôr ovos é o mesmo que produzir sintagmas, continua a violentar a rede com os seus banners importunos. Da subtil "Fábrica de Inteligência", em cuja introdução nos brinda com uma analogia do processo digestivo, à apresentação dos "Raios X", rubrica que nos deixa antever uma série de coisas excepto o fim a que se destina, passando pelo "Atelier de Joalharia de Escrita", momento de porfiosa prosa (que refere um "curso gourmet", de onde "saem textos que poderiam ser expostos num museu", objectivo eminente de toda a criação textual, diria eu; lamento, no entanto, que não refira o conteúdo em fibra da dita formação, de modo a que os textos saiam mais facilmente e com boa cor), Chagas continua a marcar pontos na vulgarização azeiteira do processo de escrita. Os seus créditos lancinantes podem ser consultados aqui, mas aproveito para lhe traçar um rápido perfil através de títulos como Já alguma Vez Usaste o Sexo sem Necessitares de Usar o Corpo, A Guerra da Secessão: 1981 - 1985, "uma obra de cariz histórico sobre a Guerra Cívil [sic] Americana", e Os Dias na Noite, "aquela que foi a sua última obra publicada nos formatos tradicionais, com apresentações a cargo do jornalista Carlos Castro e do vocalista dos Mão Morta, Adolfo Luxúria Canibal", e, consta, com a participação especial de Topo Gigio, dois unicórnios, Fernando Rosas e ainda um showcase de Elvis (Presley) a rematar. Entre as intermináveis "obras" editadas (?), contam-se a trilogia dos "Espasmos", que aguarda um terceiro tomo, assim que o autor se recompuser do segundo; uma homenagem ao pleonasmo, intitulada Chãos Pisados; obras de carácter profético, como Só os Feios é Que São Fiéis [sic], ou Porque Ris Sabendo que Vais Morrer [sic]; e coisas cuja simples menção leva a tripa a produzir involuntariamente uma arroba de palavras, como é o caso de Envelhenescer, livro já condenado pela Associação de Foneticistas Portugueses. Noto ainda que, só em 2010, brotaram nada menos que dez (10) títulos do parlapiê do Chagas. Ou, se preferirmos, dez ovos estrelados na frigideira da língua portuguesa.

13.6.12

Pay the fucking writer, motherfuckers!


À minha pequena escala, compreendo tão bem esta reacção de Harlan Ellison. Bom, e não é preciso escrever, basta trabalhar em Portugal em qualquer área criativa.

Obrigado, P.

6.6.12

A convicção do disparate


Ao fazer uma rápida pesquisa na net sobre torneios a cavalo, encontrei a seguinte descrição:

"Dado o sinal de partida ao som de instrumentos, para marcar a animação (fanfarra), eram apresentados os cavaleiros nas listas com um grande séquito. Eles eram pessoas muito simpáticas e era divertido assistir."

Se a Wikipédia o diz num português rudimentar, é porque é verdade. E todos os cavaleiros se pareciam com o Richard Gere, tinham o longo cabelo cuidadosamente arranjado em semi-permanente e faziam por vezes um ar sério e preocupado. O público agitava freneticamente bandeirinhas monárquicas, entoava um éfe-erre-á e depois iam todos comer pernas de javali assadas pelo druida da aldeia.

Por acaso ainda não fui indagar o que isto diz sobre as fogueiras medievais.

30.5.12

Uma notícia avassaladora


Não sei em que publicação online li isto. Apaguei. O meu cérebro recuou pelo menos 10 centímetros junto ao hipotálamo.

23.5.12

Escrita fracturante

Mais uma legenda antológica, pescada da distribuição gratuita, que está taco a taco com o online no aprumo estilístico. A peça falava de doenças raras, mas pouco importa, pois a universalidade deste fragmento arrasa com as exigências da contextualidade.

Visto no Destak, 22 de Maio de 2012

8.5.12

Contos de fadas


Uma bonita ilustração de David Pohl para a Weave Magazine, em torno desta ainda mais bonita citação de C.S. Lewis:

"Someday you will be old enough to start reading fairy tales again."

Arthur Miller revisitado na Broadway


Philip Seymour Hoffman como Willy Loman, em Death of a Salesman. Encenação de Mike Nichols,   Teatro Ethel Barrymore, Nova Iorque.

4.5.12

Reinam outros, por estes dias


Guerra Junqueira não seria a mais idónea das vozes republicanas, mas este ataque visceral a D. Carlos I tem uma pertinente actualidade, se o interpretarmos com a dose de humor ácido que estes tempos exigem:

"Sim, nós somos os escravos de um tirano de engorda e vista baixa. Que o porco esmague o lodo é natural. O que é inaudito, é que o ventre de um porco esmague uma nação e dez arrobas de cebo achatem quatro milhões de almas!"

(in Voz Pública, Maio de 1906)


De quem é o mundo de Mena?


Ao solapar inutilmente a web em busca de informação substancial sobre a socióloga Maria Filomena Mónica, por quem nutro uma simpatia aproximativa, percebo que a senhora desperta paixões, normalmente assassinas, entre opinadores de índole diversa. Parece-me que essas reacções derivam da raiva a uma certa esquerda iluminada, pessimista e condescendente da qual ela presumivelmente faz parte. Não sei se Maria Filomena é merecedora de tanta sanha amplificadora, mas desconfio que a importância a gratifica. Nas entrevistas que li, a autora de Bilhete de Identidade nunca renega a sua fina extracção – pelo contrário, enfatiza-a em demasia – e cheira-me que consideraria caviar um prazer demasiado mundano, se não ofensivo. Não tenho nem pretendo ter uma opinião fechada sobre Maria Filomena Mónica. Gosto de algumas coisas que escreve (nomeadamente as crónicas no Público), concordo com algumas das suas posições (sobre os exames de Português, por exemplo) e agrada-me o desassombro com que assume as suas opiniões e a sua vida, mesmo nos aspectos mais triviais, que, paradoxalmente, contradizem alguma grandiloquência intelectual. E então, a senhora é grandiloquente, sobranceira e contraditória. Do mesmo modo que é uma humanista perspicaz e insatisfeita. Parecem-me qualidades e defeitos mais aliciantes do que aqueles que se vislumbram usualmente no poleiro dos ajuizadores. Há dias, numa entrevista ao jornal i, a “Mena” disse coisas bem interessantes, entre outras de calibre inferior e até - horror - contraditórias.

Já tem dito que a incomoda sermos um povo subserviente. Como explica que continuemos assim, depois de tantos anos de democracia?

É preciso lembrarmos que o 25 de Abril foi um golpe de Estado, uma insurreição militar. Desde o século XIX até agora, em Portugal, os regimes foram sempre mudados por insurreições militares. Ora, a liberdade conquista-se. E nós nunca a conquistámos, foi sempre alguém que nos deu a liberdade. Em 1820 deram-nos o fim do antigo regime, vindo dos reis, com uma insurreição militar; em 1910, a República veio com uma insurreição militar; em 1926 foi uma insurreição militar que mudou o regime e abriu o caminho a Salazar; e em 1974 foi também uma revolta militar. Facto é que o povo não participou. E, ao não participar, torna-se um espectador alheado. Quando recebemos a liberdade dada e não temos de a conquistar, não a tratamos como nossa. A Constituição de 1822 diz: “O rei outorga.” “Outorga” significa “dá”. Foi sempre assim.

Dá que pensar e vai, de certeza, dar sustento a muita pena excitada. Mas a senhora volta aos livros e a caravana passa por cima das ideias. O habitual.

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