30.10.09

In the words of the great poet



Inspiração para o fim-de-semana, e para todas as ocasiões em que se justifique. Glad to share.

26.10.09

O nosso veneno é verde, verde...

Vasco Pulido Valente já foi aqui referido mais do que uma vez, tanto a propósito da personalidade quezilenta quanto da oportunidade da sua escrita. Mas as suas capacidades analítica e sintética são toldadas pelo espírito arruaceiro e por um ódio atávico a todas as coisas vermelhas (zeze-zeze-zeze) e proletárias, com base nesse firme argumento de que, por trás de um escritor de esquerda não academicista está sempre um vil, porém insignificante, agitador. Arruaceiro erudito, entenda-se, molhando a pena na vinagreira das suas convicções e expelindo-as com a mesma veemência de um refluxo gastroesofágico. Entre todos os intelectuais de direita, Pulido ganha a palma do ressaibo: não é protagonista político, nem autor reconhecido, nem líder de opinião. Houvera capacidade física para o ouvir nas jornaladas da Moura Guedes e até se podia ter retido qualquer coisa, mas com um timbre de enceradora e a fluidez articulatória de uma moreia, só restou a Vasco refugiar-se naquilo que faz melhor: a crónica caceteira. Isto a propósito do seu espaço habitual no Público, às 6ªs feiras, onde (na peça de 23/10), a pretexto de desvalorizar as declarações de José Saramago e de criticar uma nação que se dedica a explorar fogosamente todas as irrelevâncias a que deita mão, arrepanha as entranhas com todo o rancor e veneno que dedica ao autor em causa, à esquerda, ao PREC, ao Nobel e até, possivelmente, a alunos do politécnico (especialmente de marcenaria) que cometam a ousadia de vir a escrever romances. Premiados. Vasco… és o maior.

25.10.09

Em sonhos


A última vez em que me senti realmente vivo.

Escrever para o boneco



Foto de Carolyn Geason

23.10.09

Embrulhada








"Trabalhar com estes gajos é como trabalhar com alguém que, ao ver um canguru pela primeira vez, pensa que é o demónio."

22.10.09

Leitura recomendada

Nesta selva não há leis


É sabido que o Carga de Trabalhos se transformou na lata do lixo da Comunicação em Portugal. Genericamente falando, as ofertas de trabalho, chamemos-lhe assim, variam entre catrefadas de estágios não remunerados, numa investida sem precedentes de sôfrega exploração laboral, exigindo uma overdose de habilitações para um sem número de funções, visando um mais que certo degredo profissional; recrutamento de figuras de ficção que dão todo um novo e psicadélico sentido a multitasking – "procura-se designer e médico" é apenas o início; e postos de designação imprecisa, normalmente em inglês, com funções pitorescas e objectivos indecifráveis. Mas a coisa atinge um outro nível de incredulidade e baixeza com o anúncio ali plantado pela draftfcb Portugal, que anuncia estar a recrutar criativos no Brasil, num processo "orientado" por Edson Athayde. Um anúncio dirigido, imagino, às legiões de brasileiros que recorrem a essa bíblia dos bons empregos à procura de uma oportunidade neste abençoado país, e que exclui, acintosamente, qualquer brasileiro imigrado e, claro está, numerosos bons profissionais portugueses, desempregados ou em situação precária. Uma repuxada escarreta na cara de um mercado que está como está, num país que é o que é e numa área da Comunicação (a publicidade) onde se entra pelo alçapão das traseiras vigiado por figuras dúbias. Estes espécimes contraem gonorreia mental na troca das suas ideias iluminadas e depois dá nisto. Quando pensávamos que depois do presente da brasileira Duda ao Pingo Doce e ao país – esse piquenicão de campanha que fez estremecer as fundações do ridículo – teria início uma revolta positiva, eis que isso é apenas um indício do iminente apocalipse. Uma coisa que o Tio Olavo não disse a Edson, enquanto o sodomizava, é que não é bonito fazer o mesmo a quem o acolhe e lhe dá oportunidades. A fama que por cá granjeou dizimou, pelos vistos, a réstia de consciência que por ali andava.

Ilustração de Tiago Albuquerque

21.10.09

Finalmente



Isto está a ficar fresco.

20.10.09

Isto & Aquilo



What gets you through a hard day's work?

The Cinematic Orchestra,
Ma Fleur (2007)

Vestidas para matar



Antes, irmãs, hoje, adversárias. Freiras que sentiram o chamamento da arena. Notáveis e aguerridas demonstrações públicas de fé. Não há reza que lhes valha. A devoção paga-se em sangue. A não perder.

Em nome do senhor



"Que Ratzinger tenha a coragem de invocar Deus para reforçar o seu neomedievalismo universal, um Deus que ele jamais viu, com o qual nunca se sentou para tomar um café, mostra apenas o absoluto cinismo intelectual. (...) As insolências reacionárias da Igreja Católica precisam ser combatidas com a insolência da inteligência viva, do bom senso, da palavra responsável. Não podemos permitir que a verdade seja ofendida todos os dias por supostos representantes de Deus na Terra, os quais, na verdade, só têm interesse no poder."

José Saramago

O homem imperfeito


E aí está que os santanários ficam tão em brasa com as declarações de José Saramago como a turba se agrava com as pataratices de uma vedeta de TV brasileira. Tudo cabe no mesmo saco, com a mesma fome de carnificina. Nem vale a pena enunciar um par de diferenças fundamentais, mas neste caso seria desejável uma reacção inteligente, familiarizada com o pensamento e a postura pública do escritor. Claro está que não é a que que vemos ser explorada com grande alarido pelos meios de comunicação. Saramago gosta de torpedear a religião organizada e os seus representantes. É praticamente uma monomania. Mas tal é fruto do espírito inquieto e inconformado de um homem quase nonagenário que, à força de tão intensamente reflectir, questionar e interpretar a condição humana, acumula desilusão e amargura. E então, o que há de estranho na sua descrença? A cosmovisão de José Saramago não é uma excentricidade, é uma conquista. Triste, pessimista? É a dele. Qual é o seu crime, enquanto intelectual e escritor? Dizer o que pensa e, não raras vezes, a verdade? É impositivo, inconveniente, desagradável? É, e então? O PNR é uma manifestação escabrosa na sociedade portuguesa, com cartazes e tempo de antena. Reacções viscerais a esta vergonha, há? Quem não der valor a Saramago que o ignore, não se ponham é os arautos dos bons costumes e da salubridade moral a brandir tochas, entumescidos de raiva condenatória. Por pouco mais anda Salman Rushdie na clandestinidade há sei lá quanto tempo. O devir histórico matou as fogueiras mas não as apagou da consciência. Talvez Saramago, com o seu anticlericalismo absolutista (não está decerto contra qualquer tipo de espiritualidade ou mesmo religião per se; o senhor é ateu, ponto), se queira certificar de que as fogueiras permanecem apagadas. Milhares de anos de experimentação não corrigiram a intolerância. Saramago não é um portentoso exemplo de diálogo, mas a sua intransigência não condena ninguém e muito menos fecha a porta à interrogação.

16.10.09

A propósito da Professora Estina



Quem és tu quando e onde me olhas? Quem sou eu quando te dou tempo para parares em mim o teu olhar? Como iremos usar os minutos preciosos que o nosso encontro durou? Será que essa mão estendida me quer realmente acolher? Porque não me deixas agora partir? O corpo, no qual ainda hoje nos recolhemos, é a dobradiça da porta que se abre e fecha, o ponto onde cruzamos o dentro e o fora, aquilo que vemos e sentimos. É esse, e apenas esse, o território do encontro.

Os intérpretes descobrem-se a si mesmos e o público reinventa o ângulo de visão. “Como és” e não “quem és”. A enorme distância entre o “como” e o “quem” é a viagem da obra em busca do objecto o mais subjectivo de todos, o do desejo. “Vaivém” entre a razão e a emoção, a surpresa e o trompe-l’oeil. Percurso sinuoso, construção virtual habitada pelos nossos próprios fantasmas, funcionando como uma verdade, algo que desloca o “que vemos” para o “que queremos ver”. E que território de mal-entendido mais universal existirá que o do amor? Cada um verá o que entender, ou melhor ainda, entenderá à sua maneira aquilo que quer ver.

(Textos assinados pelo coreógrafo Rui Horta, incluídos no programa de Scope)

15.10.09

Vidas lentas



Flagra: astro cometendo estupro!

Eu queria conseguir gostar de uma novela brasileira, já que em relação às portuguesas não há esperança. E como só tenho quatro canais e uma enorme necessidade de desligar o cérebro, como tanta gente, queria ter aquela horinha de indulgência doméstica. Fui atrás da publicidade da SIC e decidi sintonizar o folhetim “Viver a Vida”, que é escrito por aquele guionista que fez aqueloutra novela que era muito boa e mais não sei quê. Simplesmente, “Viver a Vida” tem inúmeros inconvenientes, um dos quais é parecer que se desenrola em tempo real. Uma prova de vestido em tempo real, um casamento em tempo real, leitura de mensagens SMS em tempo real, conversas de chacha em tempo real. Houve ali uma elipse para os protagonistas se casarem, mas, caraças, agora até fazem o amor em tempo real. Depois há esse mesmo problema. O dos protagonistas. Ora bem, há duzentos anos atrás, quando eu era puto, o José Mayer tinha quase a mesma cara, já era galã e não parecia propriamente novo. Hoje o senhor continua com bom ar, para um homem centenário, mas faz par romântico com uma actriz que tem idade para ser sua bisneta. As cenas românticas (que são tantas, muitas, tantas, em tempo real) constituem, consequentemente, um tratado de gerontofilia. Também não tem piada nenhuma a recriação de ambientes europeus “sofisticados” na estética cabaré-chique, com flutes reluzentes por todo o lado e covers foleiras do songbook clássico americano. Gosto de levar com aquele imaginário novelesco de bilhete postal em festa, tudo bem, vamos fingir que o Brasil é assim, mas não chega e acaba por cansar. Talvez o argumentista esteja no modo contemplativo, mas a coisa está a ficar pesada e, novela por novela, acho que prefiro as notícias na RTP2.

Próteses do ofício

Hoje fui confrontado com uma série de protocolos estabelecidos entre uma empresa e diversos prestadores de serviços, visando beneficiar, pois claro, os colaboradores. Havia um, em particular, com o seguinte headline: UMA PARCERIA COM VISÃO. A entidade em causa era uma rede de produtos oftálmicos. Apesar da vergonha vicária, pensei que, neste contexto das grandes empresas, seria bem menos cansativo debitar pensamentos lineares, em auto-gestão, sem ninguém ter que aprovar ou desaprovar coisa nenhuma. E até podia fazer umas coisas mais exigentes. Por exemplo: 1. Empresa de próteses e material ortopédico: UMA PARCERIA COM PERNAS PARA ANDAR; 2. Farmácia: ESTÁS DOENTE? TENS BOM REMÉDIO; 3. Funerária: PARA QUEM ESTÁ MORTINHO POR CHEGAR A CASA; 4. Vales de refeição: COME E NÃO CHORA; 5. Centros de formação: PARA O SABER NÃO OCUPAR O TEU LUGAR; 5. Material informático: COMPUTAS… OU NÃO
COMPUTAS?...; 6. Creches: UMA PARCERIA SEMPRE A CRESCER; 7. Seguro de saúde: PORQUE SABES O QUE TE ESPERA; 8. Entidades de crédito: APROVEITA O FANTÁSTICO PACK COM SEGURO DE SAÚDE INCLUÍDO; 9. Assistência médica ao domicílio: O DOUTOR TOCA SEMPRE DUAS VEZES; 10. Marcas automóveis: UMA PARCERIA SOBRE RODAS. Por aí.

13.10.09

Que delícia (p’rá fogueira)!




Maitê Proença, esse notável agente cultural brasileiro, fez umas tristíssimas figuras neste vídeo caseiro e ainda foi exibi-lo num programa de TV brasileiro, cacarejando alegremente com umas sopeiras conterrâneas. Pegou fogo ao circo e agora só de burka é que volta cá. Até por isso a sua estupidez fere a vista, mas a mim o que me deixa alterado não é a bimbalhice duma tipa que em tantos anos de carreira, nossa, continua a exibir os dotes interpretativos de um bacuripari bem verdinho. A mim o que me mói é que para nos gozar, e por mais que se adentrem na vida e nos costumes portugueses, os brasileiros continuem a usar expressões como “pois sim” e "pois claro" para significar anuência; assim onde, desde que a nossa língua é língua, usaríamos, “claro”, "naturalmente", “com certeza”, “já vai, porca” ou, tão simplesmente, “sim”. “Pois sim” e "pois claro", ó irmãos amantes do primarismo, é uma forma irónica e relativamente culta de manifestar incredulidade. NÃO SE USA como vocês querem. Tá? Se quereis gozar, aprendei como se faz. Fora isso, acho que a Maitê está bem melhor aqui do que em A Selva, do portuguesíssimo Leonel Vieira, onde até as narinas do Diogo Morgado a eclipsavam.
Continua a brindar-nos com o teu peculiar sentido de humor, pá, e vê se agora compram os teus folhetins eróticos na Guiné-Bissau. Do Palácio da Pena (onde vivia o Salazar) para baixo é que ardeu.

Ilustração de Luke Chueh

12.10.09

Cookies

Não costumo ser dado a estas coisas, mas estou relleno de orgulho. Dois ateliers com os quais trabalho receberam prémios e menções nacionais e internacionais. Um amigo, com quem colaboro episodicamente, está a produzir uma exposição fotográfica de grande interesse e apresta-se a trazer cá ao burgo outra não menos interessante. Este é o lado irracional da vaidade, como o estímulo imediato ao ouvir alguém tratar-nos por “dr.” depois de sairmos da faculdade. Uma coisa tão fortemente idiota quanto inegavelmente cultural. Logo nos apercebemos do ridículo e chamamos a pessoa à razão, mas há ali um não sei quê de validação a que sempre aspirámos. Não existiu qualquer intervenção minha nestes trabalhos, e não é o valor (mais ou menos) subjectivo das distinções que me deslumbra. Acho que, pela primeira vez, é a realização dos outros que me faz sentir mais completo. É o orgulho de os conhecer, de confiarem em mim e, mais importante do que isso, de com eles privar. Assistir ao reconhecimento de pessoas cujo trabalho marca a diferença, na postura e na execução, é um excelente tónico para uma realidade enfermiça. Por isso, malta, vos tiro o chapéu.

Keep the fuck away from me



Tenho vergonha de quem mas fez. Falta-me andamento para a leviandade contemporânea, mas a única vantagem de fazer repetidas figuras de parvo é acabar por não sofrer mais do que meros arranhões cognitivos. Porque afecto, afecto, eu sei o que é. Deixa marcas, sim, mas não deixa cicatrizes.

Quentes e boas



Quando for mesmo grande quero ter o meu próprio negócio e vendê-lo como bem me apetecer. Quero ser como a professora Estina, mas com menos redundância vocabular e com um 's' em "devanecerão". Se a teorização se faz ao quilo, é justo que se criem novos canais de produção. Estou lá.

A vida segundo Vadim















O trabalho de ilustração do ucraniano Vadim Gannenko (também reputado designer) é absolutamente original. Gannenko tem uma forma única de reinterpretar a realidade com ironia e inquietação, onde nada é o que parece, nem temática nem figurativamente.
O pormenor, a cor e a coerência dos seus trabalhos, que podem ser lidos como uma tela in continuum, fazem dele um dos melhores profissionais da actualidade. Partilho para dar um incentivo aos meus irmãos (continuem a fazer bom trabalho... e mostrem-no). E porque dão uma sequência bestial.

9.10.09

Procura-se realidade alternativa





Uma contracção muscular, ou ruptura, ou traumatismo, ou lá o que é. O edificante Centro de Saúde e as suas tiazorras apressadas disfarçadas de agentes da saúde, funcionárias menas e funcionários nelos a fazer jus à fama tratando mal toda a gente, as urgências do Santa Maria em versão dupla com notável rapidez e igual ineficácia, uma osteopata de bota branca de cano alto. Um massacre de esoterismo para fugir ao massacre do SNS. E podemos agradecer por termos um. Devemos.
Pela primeira vez em dez anos apetece-me beber, e não é só por causa das dores.

Um susto de filme



Sam Raimi deve ter realizado Drag Me to Hell para matar saudades dos tempos de quase penúria e de provocação delirante que viram nascer a série The Evil Dead. Mas a verdade é que esses tempos, claramente, já lá vão. O seu último acto de transgressão parece ter sido pôr Tobey Maguire a dançar numa das sequências mais confrangedoras da saga Spider-Man. Se os seus melhores filmes (a meu ver, Darkman, A Simple Plan e The Gift) antecedem a rendição à indústria, não esperava que no intervalo entre um êxito estival e outro fizesse uma espécie de downgrade demoníaco de Beetlejuice, vendido como filme de “terror”. O único horror, aqui, consiste em ver a fita do princípio ao fim. Com um orçamento mais lustroso, mas sem norte nem convicção, Raimi tenta ordenhar um série Z amigo de todos os públicos e do product placement (descarado), desbaratando totalmente o gore e o factor susto em função de duas ou três sequências de humor desopilante, é certo, mas que parecem pertencer a um programa de sketches. Da péssima direcção de actores (o amadorismo dos secundários e o protagonismo desamparado de Alison Lohman e Justin Long) ao argumento desleixado, passando pelo falso ar irreverente, não há nada que se salve neste filme. O facto de a crítica em geral ser positiva só me torna mais convicto de que os escribas especializados não são mesmo de confiar.

2.10.09

Descobri o que sou



... Especialista em minudências.

Cats rule



"Time spent with cats is never wasted."

Sigmund Freud

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