15.10.09
Vidas lentas
Flagra: astro cometendo estupro!
Eu queria conseguir gostar de uma novela brasileira, já que em relação às portuguesas não há esperança. E como só tenho quatro canais e uma enorme necessidade de desligar o cérebro, como tanta gente, queria ter aquela horinha de indulgência doméstica. Fui atrás da publicidade da SIC e decidi sintonizar o folhetim “Viver a Vida”, que é escrito por aquele guionista que fez aqueloutra novela que era muito boa e mais não sei quê. Simplesmente, “Viver a Vida” tem inúmeros inconvenientes, um dos quais é parecer que se desenrola em tempo real. Uma prova de vestido em tempo real, um casamento em tempo real, leitura de mensagens SMS em tempo real, conversas de chacha em tempo real. Houve ali uma elipse para os protagonistas se casarem, mas, caraças, agora até fazem o amor em tempo real. Depois há esse mesmo problema. O dos protagonistas. Ora bem, há duzentos anos atrás, quando eu era puto, o José Mayer tinha quase a mesma cara, já era galã e não parecia propriamente novo. Hoje o senhor continua com bom ar, para um homem centenário, mas faz par romântico com uma actriz que tem idade para ser sua bisneta. As cenas românticas (que são tantas, muitas, tantas, em tempo real) constituem, consequentemente, um tratado de gerontofilia. Também não tem piada nenhuma a recriação de ambientes europeus “sofisticados” na estética cabaré-chique, com flutes reluzentes por todo o lado e covers foleiras do songbook clássico americano. Gosto de levar com aquele imaginário novelesco de bilhete postal em festa, tudo bem, vamos fingir que o Brasil é assim, mas não chega e acaba por cansar. Talvez o argumentista esteja no modo contemplativo, mas a coisa está a ficar pesada e, novela por novela, acho que prefiro as notícias na RTP2.
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