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Inspiração para o fim-de-semana, e para todas as ocasiões em que se justifique. Glad to share.
É sabido que o Carga de Trabalhos se transformou na lata do lixo da Comunicação
Ilustração de Tiago Albuquerque
E aí está que os santanários ficam tão em brasa com as declarações de José Saramago como a turba se agrava com as pataratices de uma vedeta de TV brasileira. Tudo cabe no mesmo saco, com a mesma fome de carnificina. Nem vale a pena enunciar um par de diferenças fundamentais, mas neste caso seria desejável uma reacção inteligente, familiarizada com o pensamento e a postura pública do escritor. Claro está que não é a que que vemos ser explorada com grande alarido pelos meios de comunicação. Saramago gosta de torpedear a religião organizada e os seus representantes. É praticamente uma monomania. Mas tal é fruto do espírito inquieto e inconformado de um homem quase nonagenário que, à força de tão intensamente reflectir, questionar e interpretar a condição humana, acumula desilusão e amargura. E então, o que há de estranho na sua descrença? A cosmovisão de José Saramago não é uma excentricidade, é uma conquista. Triste, pessimista? É a dele. Qual é o seu crime, enquanto intelectual e escritor? Dizer o que pensa e, não raras vezes, a verdade? É impositivo, inconveniente, desagradável? É, e então? O PNR é uma manifestação escabrosa na sociedade portuguesa, com cartazes e tempo de antena. Reacções viscerais a esta vergonha, há? Quem não der valor a Saramago que o ignore, não se ponham é os arautos dos bons costumes e da salubridade moral a brandir tochas, entumescidos de raiva condenatória. Por pouco mais anda Salman Rushdie na clandestinidade há sei lá quanto tempo. O devir histórico matou as fogueiras mas não as apagou da consciência. Talvez Saramago, com o seu anticlericalismo absolutista (não está decerto contra qualquer tipo de espiritualidade ou mesmo religião per se; o senhor é ateu, ponto), se queira certificar de que as fogueiras permanecem apagadas. Milhares de anos de experimentação não corrigiram a intolerância. Saramago não é um portentoso exemplo de diálogo, mas a sua intransigência não condena ninguém e muito menos fecha a porta à interrogação.
(Textos assinados pelo coreógrafo Rui Horta, incluídos no programa de Scope)
Hoje fui confrontado com uma série de protocolos estabelecidos entre uma empresa e diversos prestadores de serviços, visando beneficiar, pois claro, os colaboradores. Havia um, em particular, com o seguinte headline: UMA PARCERIA COM VISÃO. A entidade em causa era uma rede de produtos oftálmicos. Apesar da vergonha vicária, pensei que, neste contexto das grandes empresas, seria bem menos cansativo debitar pensamentos lineares, em auto-gestão, sem ninguém ter que aprovar ou desaprovar coisa nenhuma. E até podia fazer umas coisas mais exigentes. Por exemplo: 1. Empresa de próteses e material ortopédico: UMA PARCERIA COM PERNAS PARA ANDAR; 2. Farmácia: ESTÁS DOENTE? TENS BOM REMÉDIO; 3. Funerária: PARA QUEM ESTÁ MORTINHO POR CHEGAR A CASA; 4. Vales de refeição: COME E NÃO CHORA; 5. Centros de formação: PARA O SABER NÃO OCUPAR O TEU LUGAR; 5. Material informático: COMPUTAS… OU NÃO
COMPUTAS?...; 6. Creches: UMA PARCERIA SEMPRE A CRESCER; 7. Seguro de saúde: PORQUE SABES O QUE TE ESPERA; 8. Entidades de crédito: APROVEITA O FANTÁSTICO PACK COM SEGURO DE SAÚDE INCLUÍDO; 9. Assistência médica ao domicílio: O DOUTOR TOCA SEMPRE DUAS VEZES; 10. Marcas automóveis: UMA PARCERIA SOBRE RODAS. Por aí.