29.6.07

Geme geme la vie


Ontem fui a estúdio gravar voz para um spot. Há muito tempo que não o fazia e só os constrangimentos de tempo e de budget o proporcionaram. Não sendo a primeira vez, ‘bora lá, caça-se com gato. A verdade é que a minha voz não é versátil. Ou nunca tive tempo suficiente para a treinar e tornar mais plástica. Austeridade é o meu nome do meio, até quando falo. É uma voz que os senhores do estúdio designam por “não comercial”, elogiando a colocação e adivinhando alguma técnica. Pois, mas não passo o dia na agência a pensar que vou dar voz a produtos langorosos, sobretudo depois de uma manhã de trabalho, às 3 da tarde e com um calor do caraças. Não é para me desculpar. Mas enfim, a preocupação maior era que saísse tudo direitinho, dentro do tempo previsto e com o cliente agradado. Cedo descartei a técnica Margarida Vila Nova, que consiste em locutar todos os anúncios com um tom rouco, ressudado, quase gemente. Certo, é uma bonita especialidade, que cola bem com as massas frescas Milaneza, com a Arte Lisboa, com a campanha pró-preservativo da Câmara Municipal de Cascais, com os iogurtes Adágio… Mas faltava-me um hoompf para dar alma à coisa. Ora parecia um locutor da Emissora Nacional com aquele tom todo especioso a sair pelas narinas, ora um totó armado em sedutor a abrir as vogais como se a minha vida dependesse disso. Lá optámos pelo tom neutro, que é como quem diz “põe voz grossa, não cantes e cá vai alho”. A verdade é que saiu com o mínimo de qualidade exigível. Um colega meu, mais dado a estas artes, decidiu introduzir um gemido na sonorização, que ele próprio emitiu ao micro, com grande deleite, de resto. Se não precisassem de uma voz grossa, o rapaz teria feito a Margarida roer-se de inveja.

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