17.12.07

Venha a nós o nosso Reininho


Rui Reininho afirmou, na emissão de ontem de “Câmara Clara”, que “hoje em dia já está tudo dito”. Discutiam-se os anos 80, a eclosão do Bairro Alto como epicentro da modernidade portuguesa (ou lisboeta, se preferirmos) e as forças criativas que animavam os nascentes locais de culto. Os encontros entre criatividades inquietas e exuberantes, planeando assaltos às convenções e pavimentando o colorido caminho que artistas vindouros – numa acepção que se foi tornando cada vez mais lata, e com imensa lata – viriam a seguir. Tamanha fertilidade tinha, portanto, um prazo de validade de mais ou menos 20 anos. Não seja datado, Rui. Não me vou eu pôr a respingar sobre a sua auto-complacência nem sobre a entropia que por ali parou, porque todos beneficiámos, mais cedo ou mais tarde, deste abrir de portas sócio-cultural. E mesmo se os oitentas deram origem a um revivalismo excessivo, e muitas vezes bacoco, algo de residualmente importante ficou. De substancialmente importante, se quiserem. Dever-se-á tamanha asserção à neurose do esquecimento, a algum ressaibo já entranhado, ou ao facto de o próprio Reininho ter levado aos limites os recurso morfossintácticos e lexicais da língua portuguesa (e não só) em algumas das suas letras?

To Miss
Missing Miss
Miss Margarina
Miss Banlieu
Miss Coitus Interruptus
Shine Shine Shine Shine
Diva Divine
Deep Diva Divine
Miss Top Less Head
Miss Top Hat
Mss Slow Train Coming
Miss Garage Band
Miss Colonia
Miss Mid-West
Miss Far From-Home
Miss Crazy Head
Miss Flamenco
Miss Fado & Flamengo
Missing Miss
miss Jamaica
Miss EL-AL
Missing Mistery Girl
Deviation Divine
The Diva Shines

(“To Miss”)


É dar a cara
está na hora
A vida é cara
Língua de fora
Pintar a cara
Aqui e agora
Tralalarara
Vamos embora

Tudo o que vestes
É elegante
Ninguém se esquece
Nem o elefante

Salta da cama
Vamos embora
Ficou a fama
Vá lá não chora

(Excerto de “Motor”)

A Reininho o que é de Reininho: um homem atento, de inteligência rápida e verbo acutilante, a quem fica mal ficar tão atrapalhado com o decurso do tempo. Diga mais alto, diga diferente, mas diga. Afinal, nem todos os versos foram maus e, acima de tudo, nem todos os que aí estão são meras imitações, não é?

2 comentários:

Anónimo disse...

Eu fiquei com dúvidas... não percebi se é algum desencanto, cansaço das tertúlias, se não estava ali ou se só não quis, justamente, falar mais alto e diferente e de um só gesto calar toda a gente... durante algum tempo. É um mistério... mas gostei da tua boa memória;)...

João disse...

Tem piada... Ao reler o post, depois do teu comentário, apercebi--me de que, em vez de uma sátira velada ao senhor prestei-lhe uma pequena homenagem. O bem triunfou!

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