Marlene continua e continuará na parede com um sorriso gozão, para desmistificar as adversidades. Onde residia uma pequena esperança há agora realização. Uma pequena esperança não é o que basta, às vezes, para nos manter focados numa ideia, num projecto? Por exemplo, algo de que falámos, meio a sério, meio a brincar, numa noite fria na Ponte (foi na Ponte?). Algo que fica só entre nós. Havemos de ir os dois ao bailarico lá da aldeia, noite de Verão, de lua cheia. Menina levada para a brincadeira! E mesmo ciente de que quando você começa ninguém mais a segura, espero que o estupor do Piaget não obtenha um monopólio sine die. E já sabes, quando te sentires uma “small blue thing”, eu aqui estarei, como sempre, para o que for preciso.
Por todos os teus feitos, a perseverança demonstrada e a contínua capacidade de fazer malabarismo com múltiplas obrigações e não pequenas responsabilidades, és a minha personalidade do ano. O prémio terá de ser levantado em Lisboa, no prazo de 6 meses, na perpendicular da pizzaria.
28.12.07
27.12.07
A pensar no futuro
Feliz 2008 (agora a sério, muito a sério, algo invulgarmente sentimental)
26.12.07
A new Day has come
Ninguém sabe verdadeiramente quem é Daniel Day-Lewis nem o que o faz correr. Felizmente. É o melhor actor de cinema vivo e basta. Se vive de rendas, se é poupado ou sapateiro quando jejua dos sets, indiferente. Importa apenas que se ausente tanto, o que é compreensível para quem encarna as personagens até ao limite da loucura. Lê poucos guiões, não gosta de se promover e só regressa quando o instinto o “obriga”, como o próprio declara em entrevistas raras. É esta a natureza animal, com o seu quê de irracional, do trabalho deste actor. Em tempos convenceu-se de que o seu falecido pai o assombrava durante as representações de Hamlet, acabando por lhe ser diagnosticado um esgotamento. Os colegas de elenco de “O Meu Pé Esquerdo” consideravam-no louco por se manter in character durante toda a duração da rodagem. Genial, mas louco. Antes dos prémios e do reconhecimento universal, porém, “A Minha Bela Lavandaria” já o havia revelado a um pequeno público que reagiu proporcionalmente ao seu talento e à sua presença. Neste país aldeão, onde “A Lei do Desejo” e “O Império dos Sentidos” nos revelavam que havia vida para além - ou aquém - do hábito do Arcebispo de Braga e de que as bolinhas brancas da TV salvariam o clero da ignorância, o filme de Stephen Frears infiltrou-se quase subterraneamente. Enquanto a intelligentsia conservadora (havia outra?), a reboque do pai e do filho, discutia se deveria haver mais ou menos espírito no santo, as cenas de Daniel Day-Lewis com Gordon Wanecke estilhaçavam os paradigmas vigentes da homossexualidade, elevados a um patamar de intensidade, crueza e verdade até então inéditos. A entrega sem compromissos de Day-Lewis muito contribuiu para fazer luz nalguns espíritos tresmalhados, muito mas muito tempo antes de comungarmos de certos hinos à tolerância e ao progresso social (Brokeback Mountain my ass, passe a expressão). Seja como for, My Beautiful Laundrette não era um hino a coisa nenhuma, era um retrato cáustico, atípico e relativamente marginal de ‘outros’ conservadorismos, impostos com mão de ferro. Um projecto à medida de Daniel Day-Lewis, que desde então não tem feito outra coisa – sapatos à parte – senão espantar o mundo com o seu talento. Cinco anos depois de “Gangs de Nova Iorque” e três passados sobre uma colaboração com a mulher, Rebecca Miller, “A Balada de Jack & Rose”, Paul Thomas Anderson convenceu o actor a sair do exílio semi-permanente para interpretar uma personagem escrita expressamente para ele. Aos vossos lugares, minhas senhoras e meus senhores, porque There Will Be Blood.
19.12.07
O pão está caro e o circo não convence
Alex:
Este país já é só uma campanha de marketing, encabeçada por um vilão da Disney a galope numa diversidade carnavaleira de eventos, encontros e cimeiras. E este protagonismo cava irremediavelmente o fosso entre moderação, opinião pública, bom senso, enfim, e a ambição mais oca e desavergonhada. Portugal é um daqueles anúncios que fintam a todo o custo os malefícios do produto. Mas é cagão e alardeia méritos que não possui. E mesmo que os possuísse, teriam de ser merecidos. Esta nova acção de propaganda é o corolário de uma "filosofia" que promove e cultiva a 'celebridade referencial' através de uma demagogia anacrónica, salazarenta. Nada tem de modernidade, nada tem de construtivo. Tem tudo de vaidade pacóvia, gizada pelos 'estetas' do Governo, a sorverem a baba do seu auto-
-convencimento.
Estamos a recuar até chocar com a parede da garagem de onde nunca saímos.
18.12.07
"Coplas a la poesia de la calle"
Poesía de la calle,
Cosa de todos, sin dueño;
Yo te aprisiono un segundo,
Sólo un segundo en mi verso.
Poesía de la calle,
Torna a la calle de nuevo;
De todos sé y de ninguno,
¡Cómo una ramera, verso!
Alvaro Yunque
Cosa de todos, sin dueño;
Yo te aprisiono un segundo,
Sólo un segundo en mi verso.
Poesía de la calle,
Torna a la calle de nuevo;
De todos sé y de ninguno,
¡Cómo una ramera, verso!
Alvaro Yunque
Felizmente não cheira
No site do Ministério da Economia e da Inovação pode ler-se:
“Portugal Europe’s West Coast é a assinatura da nova campanha de promoção do país que pretende alterar a percepção externa da imagem de Portugal, posicionando-o como o País moderno, inovador e empreendedor que já é na realidade.
A campanha associa o país ao Oeste da Europa (Europe’s Weast [sic] Coast) e a conceitos de modernidade, inovação, tecnologia, empreendorismo e qualidade de vida, promovendo Portugal como um todo, desde o turismo, economia, comércio e cultura, e qualificando a oferta dos recursos, pessoas e produtos nacionais.
(…)
A campanha explora a ligação com os talentos nacionais com expressão internacional (…) entendidos como símbolos de um Portugal moderno e vencedor.
O autor das imagens da campanha de promoção, o inglês Nick Knight, é um dos mais conceituados fotógrafos mundiais. Através da sua objectiva, o país é captado de uma forma criativa, dinâmica e inovadora.”
Se o gajo que escreve isto tem consciência, anda a gastar o salário todo em psicotrópicos.
17.12.07
A permanente de João e Salomé
Um salão de cabeleireiro perto de minha casa apresenta esta recriação livre do episódio de João Baptista e Salomé, sendo que nesta versão ambos perdem a cabeça. João apresenta um look transgressor, algo andrógino, muito actual, ao passo que Salomé se mostra mais clássica e declaradamente castigadora. A posição ascendente daquela, ainda que decepada, sobre uma saia de tule satinado, assim como o tabuleiro e o corpete em papel de alumínio, não esquecendo as pérolas metalizadas que o amarram, completam a complexa mensagem da instalação. Mais do que o vanguardismo do Bairro Alto anos 80, dir-se-ia que foi Patty Diphusa quem passou por aqui.
Impalada
Quer dizer, anda um gajo a matar-se para espremer alguma criatividade destas células calcinadas, a tentar imbuir-se de imaginação, a invocar um espírito precursor... olha em volta e é isto que vê na secretária de uma colega. Aposto que o investimento estético em tua casa é mais criterioso, ou não é, sua saloia traidora?!
O português consensual
Porquê contratar artistas estrangeiros caríssimos quando, ao virar de cada esquina, damos de caras com talentos iméritos que conseguem reproduzir, com a mesma allure, a dentadura importada e as sobrancelhas impecavelmente aparadas do nosso Cristiano? Damos um retoque ao estrabismo e ao nariz, que evoca um certo imaginário africano… A coisa dá-se. Poupava-se o bolso à nação e não deixávamos de estar bem representados. Mas teriam de suprimir a Mariza da campanha, porque a moça assusta a passarada.
Venha a nós o nosso Reininho
Rui Reininho afirmou, na emissão de ontem de “Câmara Clara”, que “hoje em dia já está tudo dito”. Discutiam-se os anos 80, a eclosão do Bairro Alto como epicentro da modernidade portuguesa (ou lisboeta, se preferirmos) e as forças criativas que animavam os nascentes locais de culto. Os encontros entre criatividades inquietas e exuberantes, planeando assaltos às convenções e pavimentando o colorido caminho que artistas vindouros – numa acepção que se foi tornando cada vez mais lata, e com imensa lata – viriam a seguir. Tamanha fertilidade tinha, portanto, um prazo de validade de mais ou menos 20 anos. Não seja datado, Rui. Não me vou eu pôr a respingar sobre a sua auto-complacência nem sobre a entropia que por ali parou, porque todos beneficiámos, mais cedo ou mais tarde, deste abrir de portas sócio-cultural. E mesmo se os oitentas deram origem a um revivalismo excessivo, e muitas vezes bacoco, algo de residualmente importante ficou. De substancialmente importante, se quiserem. Dever-se-á tamanha asserção à neurose do esquecimento, a algum ressaibo já entranhado, ou ao facto de o próprio Reininho ter levado aos limites os recurso morfossintácticos e lexicais da língua portuguesa (e não só) em algumas das suas letras?
To Miss
Missing Miss
Miss Margarina
Miss Banlieu
Miss Coitus Interruptus
Shine Shine Shine Shine
Diva Divine
Deep Diva Divine
Miss Top Less Head
Miss Top Hat
Mss Slow Train Coming
Miss Garage Band
Miss Colonia
Miss Mid-West
Miss Far From-Home
Miss Crazy Head
Miss Flamenco
Miss Fado & Flamengo
Missing Miss
miss Jamaica
Miss EL-AL
Missing Mistery Girl
Deviation Divine
The Diva Shines
(“To Miss”)
É dar a cara
está na hora
A vida é cara
Língua de fora
Pintar a cara
Aqui e agora
Tralalarara
Vamos embora
Tudo o que vestes
É elegante
Ninguém se esquece
Nem o elefante
Salta da cama
Vamos embora
Ficou a fama
Vá lá não chora
(Excerto de “Motor”)
To Miss
Missing Miss
Miss Margarina
Miss Banlieu
Miss Coitus Interruptus
Shine Shine Shine Shine
Diva Divine
Deep Diva Divine
Miss Top Less Head
Miss Top Hat
Mss Slow Train Coming
Miss Garage Band
Miss Colonia
Miss Mid-West
Miss Far From-Home
Miss Crazy Head
Miss Flamenco
Miss Fado & Flamengo
Missing Miss
miss Jamaica
Miss EL-AL
Missing Mistery Girl
Deviation Divine
The Diva Shines
(“To Miss”)
É dar a cara
está na hora
A vida é cara
Língua de fora
Pintar a cara
Aqui e agora
Tralalarara
Vamos embora
Tudo o que vestes
É elegante
Ninguém se esquece
Nem o elefante
Salta da cama
Vamos embora
Ficou a fama
Vá lá não chora
(Excerto de “Motor”)
A Reininho o que é de Reininho: um homem atento, de inteligência rápida e verbo acutilante, a quem fica mal ficar tão atrapalhado com o decurso do tempo. Diga mais alto, diga diferente, mas diga. Afinal, nem todos os versos foram maus e, acima de tudo, nem todos os que aí estão são meras imitações, não é?
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