29.1.14

O lobby javardo e a infecção generalizada



Num desses canais de notícias por cabo vejo Marinho Pinto a espumar alarvamente, como é seu apanágio. A tendência imediata de carregar no comando da TV para afastar tão repugnante figura é detida por um enfático “o lobby gay!”, repetido duas ou três vezes para efeito dramático. Percebendo desde logo que se tratava de um “debate” sobre a proposta de referendo, pensei por momentos que um monumento vivo à irracionalidade poderia constituir o poster boy ideal de tamanha aberração. Porém, a realidade é bem diferente e não tem graça nenhuma. O espectáculo da vileza é aplaudido por muita gente com fome de retaliação arbitrária. A mediatização desta conversa inane, dardejando ódio, constitui a melhor protecção do referendo. É o discurso que convoca e galvaniza multidões para a queima em praça pública. Cujos urros abafam a credibilidade de especialistas e a sensatez dos verdadeiros argumentos. Facto já de si sobejamente demonstrativo e deprimente, Marinho Pinto ocupa um lugar de responsabilidade na sociedade portuguesa, em concreto na sua cada vez mais distante galáxia jurídica. É, por isso, legitimado como barómetro moral. Tem garantido tempo de antena para metralhar sem ponderar uma palavra, sem olhar sequer de relance para a extensão e gravidade dos danos que causa, começando nas crianças “que os gays [sic] usam como desculpa” para reivindicar – indignem-se os demais cidadãos! – um direito aprovado em parlamento e prescrito por todas as leis universais da decência. Coerente, portanto, com os espancamentos que a actual governação inflinge a esta pobre democracia e à sua trágica Constituição. Com os detritos largados por uma bancada parlamentar e ratificados por um presidente. Em suma, com a nojeira moral, social e política que se abateu sobre nós de forma aparentemente irremediável.

Esta não é uma questão tópica. Os palermas ululantes, entre bastonários e jotazinhas de infra-inteligência, não são meras feridas. Se existe “um lobby”, visível e de gigantesca vitalidade, é o dos grandessíssimos javardos – regentes e bufões –, que infectaram todo um país e se ocupam a aniquilar o que sobra da sua consciência. 

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