22.12.08

Cartaz do ano

Com todas as associações de críticos e sucedâneos a entregarem os habituais prémios de final de ano a Sean Penn (Milk), Mickey Rourke (The Wrestler) e Frank Langella (Frost/Nixon), pouco ou nada se tem falado do desempenho de Jeff Goldblum no mais recente filme do argumentista de Taxi Driver. Baseado no romance de Yoram Kaniuk, este drama centrado num paciente de um asilo psiquiátrico para sobreviventes do Holocausto, nos anos sessenta, recebeu aplausos em todos os festivais onde foi exibido, com especial ênfase para a interpretação de Goldblum. Os 7 Salmonetes reconhecem, para já, a excelência do cartaz.

Memória mal iluminada









O voo solitário da avestruz


Caro P.P.:

Se por um lado sei que dificilmente colocarás os olhos em cima disto, por outro não deixo de sentir uma certa pena de que alguém tão seguro de si e da verdade não seja confrontado com o ridículo dos seus cânones. Que te apanhem, por uma vez, fora do buraco que te deforma. Deixemos de lado a canónica estupidez de quem, no seu tempo, se julga detentor de certezas. As tuas convicções derivam da observação mais vazia, dos reflexos mais primários e da mais alarve resistência à complexidade da vida.
Para ti tudo é simples porque és, eminentemente, obtuso. Desces uma cortina de obscurantismo sobre um mundo paradoxal que não te interessa analisar. Bloqueias tudo o que te desafia e possa incomodar. Pior do que deixares essa mentalidade aconchegar-te à noite é apregoá-la a quem não a quer ouvir. É triste, não, é patético esse desprezo pelo bom senso, se não por uma humanidade elementar. Resumes tudo a três asnices, coladas com cuspo no desacerto da razão. É por isso que és bom nos trocadilhos. Os pensamentos passam rápida e ludicamente por um cérebro preso aos mecanismos da expressão, mas nunca à sua substância. Sim, porque nunca te vi uma ideia genuína, original, audaciosa. Só reinterpretações de formas gastas que não colocassem problemas, que não questionassem ou rompessem com os teus bem amados moldes. Os moldes a que te agarras com unhas e dentes, tão agressivamente como escorraçavas qualquer explicação mais exigente que te pudesse facultar.
As tuas ideias, se têm de existir, só como hipótese assustadora na tua dimensão. Remete-te à rotina enfadonha de sushi, vídeos caseiros e ciclocubrações e está calado. Sushi, pela Santa Igreja, que quebra de protocolo!
Se perdi tanto tempo com isto é porque um dia acreditei que seria possível trabalhar contigo. Porque um dia, de alguma forma, te tive em boa conta. Mas hoje, depois de tudo o que observei e mais tudo o que soube, só me resta um profundo e lapidar desprezo.
P.P., para se dizer as coisas que tu dizes não é preciso coragem, a coragem que me faltou para te confrontar. É preciso ser-se estúpido.
E nesse aspecto és triunfal. Triunfalmente estúpido.

A um ex-colega.

12.12.08

Novo Dicionário do Pai Natal





Por falar em coisas maradas, se quiserem dar um presente engraçado aos miúdos, porque não uma coisa com imagens e letras impressas e onde não haja carnificinas, para variar? O Novo Dicionário do Pai Natal, de Luísa Ducla Soares, com ilustrações de Rita Madeira, por exemplo e assim de repente.

Humor britânico





Goste-se ou não dos ingleses, a verdade é que os gajos têm um sentido de humor apurado e sabem utilizá-lo das mais diversas maneiras. Num catálogo de coisas maradas - de gadgets improváveis a souvenirs insólitos, passando por toda a espécie de bonecada a gozar com a iconografia local -, são capazes de produzir textos à altura dos objectos. Ou seja, realmente com piada. Uma alternativa às descrições involuntariamente cómicas e às "utilidades" (entre as quais cabe destacar o sempre útil "massajador facial") do D-Mail.

Here's another light that never goes out

Haverá tantos Dias assim



Dias Loureiro afirma que as investigações em curso "não afectam o seu estatuto de Conselheiro de Estado". Sendo a corrupção uma das mais notáveis heranças institucionais que possuímos, de tal forma que deveria existir uma Secretaria de Estado do Tesouro, Finanças, Branqueamentos, Peculato, Luvas, Offshores e Roubo Descarado - ou, tão simplesmente, Clube dos Empresários e Gestores Amigos da Suíça - é perfeitamente defensável e de enorme utilidade que Loureiro tenha acesso privilegiado à sua manta e escalfeta na salinha de reuniões da Vivenda Mariani. Enquanto o mais alto representante da nação se congratula com a consumação de um projecto político de grande alcance, em especial no bolso alheio, a Ti'Maria faz um chazinho de perpétuas roxas para que não lhe falte a garganta valorosa frente ao Ministério Público.

Calimero reloaded



Acho que já merecia ser compreendido.

10.12.08

100% nacional



Naquilo que me parece ser uma demonstração típica do espírito português, acabo de observar um senhor com uma certa idade, de boina e ar acetoso, a debater-se com uma caixa multibanco da CGD. A única disponível dentro da agência, claro está, atrás da qual se enfileiravam alguns resignados, na esperança vã de fazer continhas à vida. O homem não percebia que a máquina havia entrado em manutenção há uma boa porção de movimentos cósmicos atrás. E carregava, e olhava num impasse do pensamento, e voltava a carregar, e resmungava e ruminava, enquanto o mundo dos outros fechava para balanço. Não é ele não saber mexer com aquilo. É não esboçar uma intenção de perguntar a alguém o que se passava ali, ou sequer olhar para os outros com ar embaraçado, como que esperando que uma alma construtiva lhe fizesse ver a luz. É a teimosia cravada e a indiferença perante o que o rodeia. No caso, o que o rodeava desistiu e dirigiu-se ao balcão, depois de alguns suspiros de desdém. Quando eu estava a sair, o senhor parece ter-se apercebido de que a máquina não lhe iria devolver o cartão, e aí começava uma nova e longa  etapa na vida de todos os envolvidos. Fica a pergunta: porque é que não o avisei eu? Porque, no mais tradicional espírito tuga, não quis saber. Começo a cagar-me para estas manifestações de autismo sem idade.

Lata



Este anúncio é bonito. A realidade não.

De boa cepa



Tenho mesmo de morder a língua e de me penitenciar por todo o mal que fiz na Terra. A verdade é que, com o passar dos episódios de Os Contemporâneos, acho que o Eduardo Madeira é das melhores coisas que tem aparecido. Já sabe o que está ali a fazer, largou o registo abandalhado do início e agora mostra um timing cómico impecável e (muito) boas capacidades interpretativas. Traz sempre qualquer coisa nova às cenas, ao contrário do Bruno "reparem como o meu humor négligé é tão cool" Nogueira. Dou portanto razão ao meu colega Rui. Continuo a não gostar do programa, mas temos comediante.

7 motivos para estar feliz



As BDs do Edgar P. Jacobs (e do Yves Sente e André Juillard), várias e baratas na Bertrand de Coimbra.



Chet in my room.



O Tiago a ilustrar a parede.



Insólito, de Loustal.



Plantas com picardia.



Decoração da época.



Finalmente, o mundo!

2.12.08

Se precisas de um bom apoio



Apoia-te nos pés.

Se não tiveres um Paulo, que os põe a andar no bom caminho.

Sem preconceitos



Na minha terra não há nada à minha espera. A minha terra faz-me desaparecer. A minha terra é redundante e enfadonha. É cinzenta mesmo quando faz sol. A minha terra é presunçosamente pequena, é um círculo fechado, é um ponto de passagem sem promessas nem objectivos. Que nunca me deu nada que eu não tivesse de desenterrar e polir. Que terra era aquela onde não havia desejos, não há, nunca houve? Eu nunca quis terra assim, não é minha, não a escolhi. Quando saí desta "minha terra" foi para não voltar. E quando voltei ela regurgitou-me. Por tudo isso, ou por quase nada, as intermitências não precisam de fingir luz. Essa luz que nunca se faz sentir.

Mudam-se os tempos




Intervenção de Paul Cox sobre Et In Arcadia Ego (c.1638-1640), de Nicolas Poussin

28.11.08

Só o presente tem sentimento

Ao fim de um certo tempo deparamo-nos com a inevitável confusão entre saber amar e saber estar.

Era uma casa muito engraçada



Mas não tinha nada, não tinha nada.

Sun in an Empty Room, Edward Hopper, 1963

Kelly watch the stars














Apanha uma moça trigueira com as luzes neon e é vê-la a correr estrada da perdição abaixo.

Cantar de Gala



Tenho a dizer que nunca mais fico hospedada naquela pensão e que da próxima vez é melhor que os cartões não sejam escritos à mão.



É para devolver no fim, ok?




'Tão a gostar, hã, 'tão? E olha que ficou tudo muito em conta!



Psst, vous, you, achtung, este prémio é seu?



E uma gaja aqui toda apertadinha...



Isto não anda? O último autocarro é às onze.




Super, super!...Quem é o gajo?




Foi o que se pôde arranjar, está bem?




Estou sem palavras. O foco não me deixa ler.




Posso ir? Tenho de decorar as deixas do meu novo filme, La Nonne qui Aimait Manger à Poil.

Marketing para quê?



"O nosso forte é a confiança. Tipo, não vale a pena entrar em despesas que aqui a malta conhece-se toda". Só há pauzinhos de plástico para o café.



A loja não se chama Roswell nem Eu Quero Acreditar, mas o manequim irá decerto atrair elementos anónimos da Sociedade Portuguesa de Ovnilogia. Um chapeuzinho daqueles só pode ser código.



Quando o nome próprio se encontra com o verbo no imperativo, para um efeito de grande intensidade e persuasão. Alternativa estilítica: "Anda cá que o senhor já te sara, Portugal!".



Este rapaz de olhar prevenido e sorriso mais ou menos rasgado dá a cara e um je ne sais quoi, que prefiro continuar a desconhecer, aos discos rígidos Canyon. Caixa mai'linda, fosca-se.

Terapia para que te quero

Um forte motivo para espreitar este filme



- Ouve bem miúdo, é assim que se faz.

Ontem fui ver o Body of Lies e gostei mais do que estava à espera. Ridley Scott é de um profissionalismo portentoso e o que lhe falta em génio tem em elegância, concisão e pragmatismo. O senhor não dá um passo em falso (bom, sim, por vezes) e faz empalidecer qualquer jovem aspirante a maestro de acção. Ponham os olhos no homem, Ratner, McG e restante escória. Ou melhor, não ponham e dediquem-se aos videojogos. O argumento de William Monahan é sólido, com umas tiradas memoráveis que Russel Crowe degusta devidamente, mas pareceu-me uma versão simplificada de Syriana, com mais espectáculo e menos consternação. Leonardo DiCaprio investe-se no papel, como sempre, de resto, mas está a léguas do carisma dos seus colegas de elenco, sendo especialmente cilindrado por Mark Strong, o segredo mais bem guardado do cinema, teatro e TV britânicos. Não por muito tempo: nem segredo nem britânico. Se virem o filme percebem porquê.

27.11.08

Nem a brincar



Van Gogh já sofreu todo o tipo de indignidades. Em vida e depois de morto. E não há limites. Quem faz dinheiro com isto pode, de resto, explorar um filão inesgotável. Proponho, para o próximo Natal, uma bonequinha Sylvia Plath em rigor mortis (não articulada, portanto), ainda com o forno na cabeça, e, mesmo a tempo das celebrações pascais, um pequeno Mishima de espada atravessada (esta sim, articulada). Viva a sociedade de consumo e a sua mitomania em PVC.

A hora de Daldry


Stephen Daldry está de regresso. Baseado num romance de Bernhard Schlink, adaptado por David Hare, The Reader respira classe por todo o lado, a começar pelo cartaz. Menos não seria de esperar do realizador de The Hours, um livro que muitos consideravam intransponível para cinema. Kate Wislet cimenta a sua posição de class act de uma geração, acompanhada pelo subvalorizado Ralph Fiennes. Tempos houve em que Fiennes era considerado para todo e qualquer papel, mas as suas escolhas profissionais erráticas e uma atribulada vida pessoal acabaram por, de certa forma, encostá-lo à box. Assista-se ao renascimento do senhor galês, cujo nome se pronuncia pomposamente [rayf faines] em filmes como The Duchess e, em particular, In Bruges. E digam lá se há psicótico com mais estilo.

Tiro na roda


















Yes. The planet's blood, motherfucker!

24.11.08

Filosofia do dia



Ricardo:

"Sabiam que o mundo vai acabar em 2012?"

João Pedro:

"É provável."

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