8.3.06

A Oscar o que é de Oscar: as manhas de Hollywood e o mérito de Crash


Os Oscars têm a importância que se lhes queira dar e é consensual que não deveria ser muita. Por outro lado, simpatia (e mera simpatia) por vencedores ou perdedores à parte, qualquer pessoa com gosto e o mínimo de autonomia carrega no coração uma outra história e um outro desempenho que encontram eco em meia-dúzia de almas. Ou não. O filme que é só nosso. Aquele que parece ter-nos sido dirigido e merecedor de todas as honrarias. Ou não. Porque não é partilhável nem mundano. São essas emoções secretas, que para muita gente ganharam amplificação planetária através de um filme como “O Segredo de Brockeback Mountain”, que não são ou não deveriam ser qualificadas e hierarquizadas por 6.000 indivíduos anónimos, com as mais diversas (in)formações, cujo traço comum é estarem de alguma forma envolvidos na indústria do cinema. Indústria. Homofobia? Indústria. A distribuidora canadiana Lionsgate Entertainment gastou 2 milhões de dólares na promoção de Crash - “Colisão”. Grande parte dos membros da AMPAS, entre Nova-Iorque e Londres, recebeu o screener (DVD promocional) deste filme antes de qualquer outro, visto a sua estreia se ter verificado bastante cedo nos EUA, e uns quantos mais uma semana antes da data de entrega dos boletins de voto.

Estamos a falar de Hollywood. De uma máquina de fazer dinheiro que, antes mesmo de enfiar o Oscar de Melhor Actriz pela goela dos anti-WASP abaixo, já tinha tornado Reese Whiterspoon a actriz mais bem paga de sempre, com um cachet de 29 milhões de dólares por um filme vindouro. De gente altamente influenciável pelo que lhes é familiar. Los Angeles, tensão racial, fast food, choradeira, vias rápidas... Se o filme trocasse os cowboys intimistas por marines em defesa da pátria, se estes partilhassem um casto beijo em 120 minutos de metragem – e raramente o ecrã –, um deles morresse em cenário bélico e suficientemente esquartejado, falaríamos de outras aspirações. O marine sobrevivente dedicar-se-ia à ascese militarista, em abnegado silêncio (e abstinência), depois de se consultar com o melhor amigo (negro), cuja esposa se encontraria grávida. Ambos lhe emprestariam um sofá e muita compreensão. Seria um amor sujo e suado, nascido da luta comum, em perfeita harmonia com a violência reinante. Um amor único, marcado pelo sofrimento e pela impossibilidade. Brad Pitt no protagonista e a subtileza de Oliver Stone nos arreios e estávamos falados. Sendo uma fita de Stone, haveria uma forte componente humanista e pró-monhé. Querem melhor?

Enfim, Crash é um bom filme, mas a Academia não é o Grande Cérebro .
Lá estavam o Clooney, o Ang, “Munique”, Altman e Syriana. O resto é circo, minha gente! Desfrutem que não engorda.

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