15.7.09

O ecrã é demasiado pequeno para Angela Bassett



Hollywood não soube o que fazer com Angela Bassett. Como não sabe o que fazer com nenhuma actriz afro-americana que queira ser levada a sério. Não, também não sabe o que fazer com Halle Berry, se é que a podemos considerar uma representante convencional de negritude no ecrã, e não o mero estereótipo da mestiça provocante. E, em última análise, Berry parece ter desistido de ser levada a sério, apesar de ser boa actriz. Mas Bassett é melhor. Explodiu no grande ecrã em What’s Love Got To Do With It, um filme que era pequeno demais para a sua intensidade mas que fazia justiça ao seu preciosismo. Um físico robusto e feições atípicas, algo agressivas, se já limitativas numa actriz branca, transformaram-se na pecha de Bassett, que foi imediatamente catalogada como a tough broad de serviço, o que siginificava que lhe estava vedado o protagonismo como estrela romântica ou como consciência moral em filmes de mensagem. Era demasiado dura, e negra, para o gosto dominante. Enquanto Jodie Foster enfrentava o sistema, Meg Ryan enxaropava o ambiente e Julianne Moore fazia filmes arty, Bassett era relegada para papéis secundários que poderiam beneficiar com a autoridade da sua presença. Malcolm X, Waiting to Exhale e Contact são disso exemplo. Raramente o seu potencial terá sido tão bem aproveitado como em Strange Days, com Kathryn Bigelow a conferir-lhe uma aura de bela heroína, magoada e combativa, que não teve repercussões de maior. Reencontrei-me com Angela Bassett no outro dia, quando liguei a TV para ver um daqueles enlatados americanos que passam na RTP2, por sinal o mais decente deles todos, comparado com coisas mentecaptas como Fringe e The Mentalist. Era uma nova série de E.R., e a actriz surgia na pele da Dr.ª Cate Banfield, uma chefe de serviço de pulso firme, claro, mas com uma insondável vulnerabilidade. E lá estavam a mesma disponibilidade emocional, a subtileza, o olhar penetrante, a elocução precisa... Uma cena em particular, quando Banfield se despede de uma médica que abandona a profissão, com vontade de a demover, pois viu nela o que mais se aproximava de uma amiga, é um prodígio de contenção e veracidade, com todos os sentimentos contraditórios da autoridade que se desfaz perante o desamparo emocional a virem ao de cima, em poucas palavras, num par de minutos. Uma vez mais, Angela Bassett eleva o nível dos projectos em que participa, mas estes continuam a ser pequenos demais para ela.

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