15.3.07

Faye queridíssima


Faye Dunaway protagonizou Chinatown, Bonnie and Clyde, The Thomas Crown Affair, Network (pelo qual venceu o Oscar de Melhor Actriz, em 1976) e Three Days of the Condor. E só estes títulos seriam suficientes para lhe garantir um lugar de destaque na história do cinema. Durante os anos 70, Dunaway foi aclamada como um dos grandes talentos da sua geração e o prestígio que os referidos filmes lhe granjearam prometiam uma carreira inspirada. No entanto, uma sucessão de escolhas cataclísmicas no dealbar dos 80 entortou irreversivelmente um percurso que, três décadas e incontáveis plásticas depois, não tem remissão possível, aprisionando uma notável força vital num corpo de barbie sexagenária.
O debacle terá começado com uma demonstração do seu temperamento excessivo. Em 1981 estreia Mommie Dearest, adaptação de uma biografia de Joan Crawford escrita pela filha adoptiva, Christina. Hoje considerado um clássico camp, Mommie tornar-se-ia uma das fitas mais ridicularizadas da época, tida como um retrato desgovernado e caricatural de Crawford. Explorando sem pudor nem subtileza as falhas e os pôdres de uma grande actriz que era, também, uma mulher perturbada, o filme demonizava o seu objecto sem uma pinga de comedimento. Visto friamente, Mommie Dearest não passa de um telefilme medíocre, exacerbando o drama ressabiado de Christina através de um único argumento válido: Faye Dunaway. A actriz entregou-se com tal veemência ao papel que se lhe acabaria por colar à pele o rótulo de diva decadente e desequilibrada – talvez em consonância com algumas atitudes tidas na época –, canibalizando a sua própria carreira. Esta master class de overacting tornou-a alvo de descrédito e só lentamente recuperou a estima dos realizadores e dos estúdios, sem nunca alcançar o fulgor de outrora. Barbet Schroeder recuperou-a para um papel memorável em Barfly, permitindo-nos relembrar o seu grande talento, e Emir Kusturica deu-lhe protagonismo em Arizona Dream, em 1993, mas Dunaway é, hoje, mais um espectro do que poderia ter sido (ou do que gostaríamos que tivesse sido) do que um talento verdadeiramente consumado. No entanto, a sua beleza felina e os seus raros desempenhos viscerais perdurarão na memória colectiva.

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