30.7.08

Away




















"In summer, the song sings itself."


William Carlos Williams

25.7.08

Levar com a brifa



Alguém se esqueceu do copy (como sempre), mas as emoções estão todas lá.

Obrigado, P.

22.7.08

Fracturas

"Cavaco promulga acordo ortográfico

O presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, já promulgou o Acordo Ortográfico, ratificado no Parlamento a 16 de Maio deste ano, disse, ontem, à agência Lusa, fonte oficial da presidência.


O Acordo Ortográfico só poderá entrar em vigor depois de estarem depositados todos os documentos de ratificação no Ministério dos Negócios Estrangeiros, segundo fonte do Ministério da Cultura.


O Segundo Protocolo do Acordo Ortográfico, cuja ratificação era essencial para a entrada em vigor do acordo, foi aprovado no Parlamento a 16 de Maio com os votos favoráveis do PS, PSD, Bloco de Esquerda e sete deputados do CDS."


JN Online, 22-07-08



Com a rejeição generalizada da população que cresceu com o Acordo anterior, esta nova grafia vai ter pouco valor prático, mesmo que seja adoptada publicamente em suportes informativos, publicitários, etc. Quem é que tem cabeça para assimilar as novas regras morfossintácticas (mais propícias a erros de hipercorrecção e a confusões orais - "fato" vs. "facto")? É algo que se vai instalar lenta e vagarosamente e que se imporá, finalmente, através de novas faixas demográficas cultas. O que me preocupa mais é a sua actualização de facto. Receio que as instituições de ensino não tenham capacidade para consolidar uma norma, temo pelas frágeis estruturas linguísticas dos mais novos, mas prevejo ainda mais dificuldades para os teóricos, linguistas e gramáticos, que têm de construir uma ponte artificial para o étimo, de forma a preservar o sentido original da palavra. Há também que arranjar justificações plausíveis para a subsistência de certas formas e a extinção de outras. E como dificilmente acontecerá uma modernização do ensino do Latim, a distância entre a origem e o seu correlativo será cada vez maior, assim como a ambiguidade e, por consequência, o desrespeito a uma convenção. A língua não é um instrumento abstracto. Não pode voar sem uma matemática específica, sem apetrechos adequados. Para se poder evoluir tem que se saber respeitar o edifício em que está instalada, e este governo, como em tantas outras situações, só retocou a fachada sem se preocupar com rigorosamente mais nada. Querem lá saber, a única língua que os escroques falam escreve-se em €. Veremos o que fazem as futuras gerações com o que vão herdar, e espero que haja iniciativas visíveis e sólidas no sentido de modernizar e harmonizar a língua, pois a ideia é que não estamos sós. Quanto a mim, vou tentando o bilinguismo.

4.7.08

Na Serra da Fóia



Só me apetece ir embora.

Um homem e um bolo

Quando era puto e vivia em Abrantes, a minha avó Alcina levava-me uma vez por semana à pastelaria e deixava-me escolher um bolo. Hábito que ainda se estendeu brevemente a Coimbra, onde, durante muito tempo, poucas consolações havia. Tinha a minha avó para me fazer sentir especial (às vezes demasiado) e para me azucrinar o juízo. Quando ela achava que eu ensimesmava, pegava em mim e íamos passear, com trajecto obrigatório pela Rua da Sofia. Ela dava-me o que podia dar, e eu escolhia, invariavelmente, um guardanapo. Na altura não me importava de trincar o açúcar branco e não queria saber se o creme era feito com ovos em pó. Se calhar eram ovos a sério, porque sabia mesmo bem e era um tempo em que as coisas eram honestas. Fidelizei-me ao guardanapo, nesse ritual com a minha avó. A minha avó, que me mimou até estragar, que gostou de mim mais do que uma mãe e que eu não soube acarinhar como merecia, porque partiu demasiado cedo. Talvez tenha perdido a oportunidade de me reconciliar com o mundo. Talvez tenha ficado com ela um código de pertença. Há muitos anos que deixei de comer guardanapos ou sequer de reparar neles. Este, como tantos outros rituais que associamos às pessoas que amamos, deixou de ter sentido e acabou memória perdida. No meu caso, não tanto porque doa, mas porque o rejeitei. Recusei ficar sozinho, quando a minha avó partiu. Eu e o guardanapo não nos reencontrámos, somos velhos amigos desavindos, estamos mudados e fora de moda. Mas fico contente por saber que a oferta não desapareceu.

2.7.08

É sempre a mesma velha cantiga

















E eu já não quero ouvi-la mais.

1.7.08

Uma campanha muito discutível







Não deveria um Memorial destes ser menos, hum... belicoso?

O meu SUV é maior que o teu



Em pleno debacle do equilíbrio ambiental e perante a crise universal de consciências, a indústria automóvel decidiu agir em prol do bem comum. Lançou um veículo particularmente vistoso, ideal para os burgueses que não querem passar os seus últimos anos na terra sem terem a certeza de que alguém reparou neles. O automóvel em causa designa-se por SUV (Sport Utility Vehicle). Cruza o porte de um todo-o-terreno com os desempenhos de um desportivo e a ostentação de uma berlina de luxo. É grande, é potente, é caro, e tem a vantagem de provocar estragos ambientais na cidade, na estrada, no campo, ou por onde quer que os seus intrépidos proprietários decidam passeá-lo. Em tempos costruíam-se Jeep, Land-Rover, mais tarde Land-Cruiser e Pajero. Máquinas com utilidades e aplicações específicas (não por isso menos poluentes), feitas para costados rijos. Nos EUA, os Hummer saíram das fileiras do exército para os centros urbanos. A população cedo viu nestes carros gordos e gastadores o reflexo de um status quo que passava essencialmente por a galinha da vizinha não poder ser maior que a minha. Em meados dos anos 90, imponentes Chevrolet, GMC, Dodge e Range Rover povoavam os subúrbios, fazendo tremer a generalidade dos condutores com a possibilidade de desentendimentos na rodovia. O número de peões atingidos por viaturas de grande porte também aumentou e, geralmente, o SUV levou a melhor. Hoje em dia, versões europeizadas e finórias destes carros, fabricados por quase todos os construtores mundiais, decoram as vias de países ricos e civilizados como, por exemplo, Portugal. É um sinal de progresso, decerto, ver um VW Touareg (como o nome indica, ideal para uso citadino) estacionado nas ruas amplas deste país, a ocupar quase tanto de passeio quanto de estrada. Também é bom saber que o seu condutor faz frente à crise petrolífera com a mesma audácia e discernimento que levaram D. Sebastião a atirar-se àqueles homens maus e feios para os lados de Portimão. Com estas bestas a engolirem mais combustível por quilómetro do que uma frota de Smart aos cem, a despejarem quantidades inomináveis de dióxido de carbono na atmosfera, a atafulharem ainda mais o já abarrotado trânsito citadino e a constituírem um perigo rodoviário se conduzidos por tiazorras lambuzadas a zurrar ao telemóvel, a sua existência não é apenas um contrasenso, é mais uma manifestação da infinitude da estupidez humana. Curiosamente, onde tudo começou, a General Motors está a descontinuar estes carros. As motivações são supostamente ambientais, mas todos sabemos que o “ambiental”, neste contexto, tem um sentido muito alargado. Não há combustível, a crise está a atingir proporções épicas, a procura caiu drasticamente, o estatuto converteu-se em estigma e as fábricas estão a fechar as portas. É sabido que a existência dos SUV tem um fim à vista, mas os construtores não cessam de apresentar novos pregos para o caixão da Terra. Até os favoritos da família, Renault, Citroën, Fiat e, claro, VW, aderiram entusiasticamente a esta moda suicida. Isto até ao dia em que, interditos os popós, a maltinha arranje outra maneira qualquer de continuar a foder o Planeta. Desde que se possam pavonear com ela, claro está.

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